terça-feira, novembro 5

Miopia

Nunca lavou tanta louça. Não que tivessem baixelas de prata ou jogos de jantar para banquete. Três pratos, muitos copos de requeijão e três panelas. E quatro garfos. Uma colher de pau que vivia embolorada. A única faca, dos vizinhos da frente. Não tinham lá mais talheres do que elas, mas na última briga, eles resolveram deixar a faca sob custódia das meninas. Ninguém queria polícia perto.

Vez em quando espichava um olho comprido até a sala. Já havia ensaboado e enxaguado cada copo seis vezes. Perguntou-se se detergente dava barato. Espiou de novo. Porta do quarto fechada. Dorzinha aguda na barriga. Ao menos haviam feito o favor de colocar travesseiro e lençol para fora. Pegou a trouxa no chão e foi se ajeitar no sofá.

Despertou no susto. Sol alto. Porta do quarto aberta.

Ao pisar no chão, algo espetou-lhe o pé. Uma raiva descabida para o acontecido. Caiu no chão decidida a picar o tapete com os dentes! Deu de cara com um par de óculos. Esmigalhados. Congelou. Tocou os cacos no chão com a ponta dos dedos. Um vago tremor pelo corpo. Finalmente ela aparece vinda do quintal, cabelos recém-lavados. Levanta-se de um salto.

- E aí?
- O dinheiro táli no pote.
- Então...
- Então nada, ué. Não falei?
- Mas o dinheiro...
- Tem nada, não falei já, teimosia?

Pão dormido aquecido na frigideira. Café amargo em silêncio. Antes de sair:

- Me faz um favor? Não me traga mais esses moleques da escola.


Mal ouviu. Sua alma ria baixinho ao pensar que no embassamento da miopia ele bem que podia ter enxergado a filha no rosto da mãe.

segunda-feira, novembro 4

Doença da ave louca

Passando por um arrozal, algumas semanas atrás, fiquei intrigada com a quantidade de saquinhos de lixo espalhados pelo campo. "Que gente porca!" comentei em voz alta. "Que gente, Luciana?". "Essa gente que fica jogando saco de lixo pelo arrozal. Olha quantos!".

Alguns segundos de silêncio. Sinapse, sinapse, sinapse. Barulho de ficha caindo.
"São marrecos, Luciana!"

Hoje, escolada com a lição, passava pelos mesmo campos e pensava em novamente ver os arrozais cheios de marrecos. Quando longe eu vejo váááários... perus! Enormes! Todos enfileirados olhando para uma placa. "Olha lá, gente, que bonitinho, um monte de perus na frente daquela placa!"

Mais uns segundos de silêncio. Sinapse, sinapse, sinapse. Mais algumas fichas caindo.
"São holofotes, Luciana!"

Devo estar com algum tipo de gripe aviária. No cérebro.

quinta-feira, junho 9

Da memória e da intolerância

Fico eu aqui imaginando (sim, eu imagino muito, senhores) se o os machistas chilenos se lembram que seu país foi fundado por uma mulher, amasiada, sexualmente resolvida e casca grossa. Fico eu imaginando também se os puritanos americanos lembram-se que vieram da mesma ilha que produziu Black Sabbath, Beatles e Roling Stones. Se os adoradores da Persia antiga como forma de dizer, “ei! aqui no Irã nem sempre foi assim”, lembram-se da bela Sherazade e das histórias que contava pela metade para poder ganhar mais uma noite de vida.

Fico imaginando ainda você, sim, você meu senhor, que reza pela cartilha da lei de Gerson, fico imaginando se você se lembra que sua mãe lhe pariu, sujo e chorando, igualzinho a sua muito uniformizada e humilde copeira.

Depois tem gente que ainda se espanta com intolerância. É tudo uma questão de memória. E como sabemos, senhores, ela é deveras curta...

segunda-feira, junho 6

Não: não digas nada

Não: não digas nada
Supor o que dirá
A tua boca velada
É ouvi-lo já
É ouvi-lo melhor
Do que o dirias (...)

(João Ricardo, sobre poema de Fernando Pessoa)

quinta-feira, junho 2

Erico Veríssimo e a psicanálise

Fico pensando se fazer terapia não é meio como morrer em Antares. Você fica ali só rezando para acabar a greve dos coveiros. E enquanto ela não acaba, vai se dispondo ao escrutínio de um estranho. Que também morreu, alías. E porque é morto, assim como a Inez, que ninguém sabe de que morreu afinal, mas o é, fato, não tem nenhum pudor em cutucar as feridas alheias.

Mas por fim, vc que é morto também, ora merda, desalentado pelos coveiros que não se dispõe, passa a vasculhar a vida alheia (sua) revelando toda a podridão moral a que se submete um cristão.

Mas difícil mesmo, foda pra caralho, é quando os coveiros voltam a trabalhar..

segunda-feira, maio 30

Despertar é Preciso

Na primeira noite eles aproximam-se e colhem uma Flor do nosso jardim e não dizemos nada.
Na segunda noite, Já não se escondem; pisam as flores, matam o nosso cão, e não dizemos nada.
Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque não dissemos nada, Já não podemos dizer nada.
(Vladimir Maiakovski)

quinta-feira, março 18

As Rosas não falam?

Estava tentando explicar para uma amiga querida porque diabos havia tatuado rosas na perna, uma coisa tão menininha e que, segundo ela, definitivamente não combinam comigo. Recebi como resposta à explicação:

"Eu acho que é culpa da Neiva por ela ter te deixado de castigo, e
ainda ter te esquecido lá, sentadinha num banco olhando pra parede em
um canto da sala. Sabe se lá as "idéias" que as paredes trocaram com
vc. Por acaso vc não ouvia vozes, ouvia?"

E eis a explicação:

Uma bela criança, uma menina branquinha de bochechas vermelhas, cabelo escuro e escorrido cortado a lá tijelinha. Quase uma promessa de Branca de Neve, de tão linda. Era verão, e no pátio do Centro Educacional SESI Vila Leopoldina todas as crianças estava em fila para prestar homengens para a diretora que fazia aniversário, ou ia se aposentar ou qualquer outro motivo idiota que se usa pra juntar criannças num pátio debaixo de um sol inclemente sem serem denunciados por mals tratos.

E lá estava a bela criança de cabelo tijelinha, de saquinho cheio, segurando uma rosa que deveria ser dada à diretora num determinado momento muito importante que ela não sabia bem qual era mas que a professora ia dizer. Aliás, cada criança segurava uma rosa. Vermelha. Debaixo daquele sol. Espero que o sistema de educação infantil tenha evoluído um pouco de lá pra cá. E, a bela criança, suada, irritada com o sol e com aquele momento importante que não chegava nunca, espetou o dedo no espinho. Prática como fora desde que nasceu, arrancou todos. Um por um. Um pouco pra matar o tédio, um pouco de raiva mesmo. E discurso vai, discurso vem, em certo momento a diretora diz algo como: "Muit obrigada minhas (minhas o caralho, sou da minha mãe!) crianças por essa doce homengem, vcs tão pequeninos, que espetaram suas mãozinhas nos espinhos... e blá blá blá"

E blá blá blá porque a bela criança não ouviu mas nada. Só seus colegas dizendo: "Rá rá rá, vc tirou os espinhos da sua rosa! Rá rá rá". Indiginada com tanta burrice ao seu redor a bela criaturinha, num acesso de fúria, começa a gritar: "Vocês não sabem o que é uma metafora seus burros? Me-Tá-Fo-Rá!"

E o resto é lenda. Dizem que a professora teve que intervir com a ajuda do zelador pois a bela criança de cabelo tijelinha já estava mordendo a canela de um amiguinho. Outros dizem que ela furou os olhos da professora com o cabo da rosa. A verdade verdadeira nunca será conhecida.

segunda-feira, julho 13

O tempo voa e até a poupança Bamerindus ó...

Muitas vezes tropecei em pessoas admiráveis e que me serviram de exemplo: chefes, professores, Carlão com seu jeito doido de fazer negócios e tomar sorvete ao mesmo tempo. Armando Boito, atrapalhado e brilhante, ensinou que até a esquerda tem muitos lados, quase todos tão ruins quanto os muitos lados da direita. Graça, com seu estilo morde-assopra de fazer um cristão virar gente. em dois tempos. E mais recentemente a Inez que pela integridade de seu caráter e pelo exemplo me ensinou mais profissionalmente em poucos anos do que provavelmente vou aprender o resto da minha vida.


Olhando pra todos eles vejo que carrego um pouco de cada um. Ou será que já tinha essas coisas todas comigo? Sei lá, só sinto que estou pronta para subir mais um degrau. Mesmo com essa perna amarrada ao pé da mesa.


Alguém aí tem um tesoura, por favor?

domingo, junho 14

CQC e gorgonzola.

E não gosto do CQC assim como você pode não gostar de gorgonzola. Mesmo tendo descoberto recentemente que sou fã de longa data de um dos mais novos roteiristas do programa (parabéns Marco Aurélio!). Ou você que não come gorgonzola, vai passar a comer só porque viu a gostosa da sua vizinha comendo? Vai? Ok, esquece o gorgonzola.
Todas as vezes que tento explicar por que não me agrada o CQC recebo olhares incrédulos acompanhados de “ohs” abafados como se eu fosse uma herege: é um absurdo alguém não gostar do CQC, porque ele é inteligente, porque ele cumpre um papel social, porque é um serviço de utilidade pública. Já ouvi de um tudo.
Vou tentar de novo. Me diga: qual a diferença entre tirar sarro de um político corrupto e de um cadeirante?
- Ô dona Ins-pirada, é óbvio que o político corrupto merece e o cadeirante, coitadinho, não né...
Em minha opinião o político corrupto merece é ir para a cadeia enquanto o cadeirante não merece mais pena do que eu ou você. Ele não pode andar com as próprias pernas? Eu não consigo fritar um ovo inteiro. Cada um com suas limitações.
Sei que o homem é o único animal que ri e que o humor e os tipos de humor acompanham costumes, culturas e correntes de pensamento. Mais do que isso, reconheço nas várias formas de humor a semente da crítica social e acho de verdade que o riso e a reflexão são compatíveis. Vou além: acho que uma piada racista ou homofóbica, quando bem colocadas, servem mesmo para expor o ridículo dessas formas de pensar. Mas daí expor pessoas ou humilha-las usando o argumento de que “elas merecem” ou “mas são idéias tão inteligentes”, é um caminho perigoso que pode escorregar facilmente no preconceito. Com o político corrupto pode, com o cadeirante coitadinho não pode? Não sejamos tão apressados em julgar...
Clamo pelo fim do programa? De forma alguma. Afinal, ora merda, estamos num país democrático e que assim permaneça, amém. Apenas digo que é um tipo de humor que me incomoda e, de minha parte, simplesmente mudo o canal e vou comer pão com gorgonzola.

terça-feira, junho 2

Separando o joio do trigo

Estou aprendendo a conviver relativamente bem com esse mundo de treinamentos corporativos, mas tem algumas coisas que nunca vou tolerar: palestras motivacionais e dinâmicas idiotas!

Mooito bem. Isso posto, vamos à esculhambação.

Tem uma dinâmica muito das bestas (a menos que você esteja trabalhando com crianças de pré-escola e ainda assim a tia corre o risco de ser tachada de retardada e perder totalmente o controle da classe) que diz que todo mundo vai ganhar um presente. O presente é uma caixa com um espelho no fundo. Depois de olhar dentro da caixa, cada um tem que desenhar o seu presente. Hã? Hã? Sacou?

Pois bem.

Não é que uma anta desenhou uma caixa com espelho dentro...

quinta-feira, maio 14

Dois pesos, meia medida

Sabe por que os ataques que os israelenses fazem aos palestinos são chamados de ofensivas enquanto os ataques dos palestinos aos israelenses são chamados de atos terroristas? Porque um estado soberano tem o direito de se defender, mas uma etnia sem território não porque não constitui um estado, muito menos soberano, justamente porque lhe falta um território.


Se essa lógica vale (e vale; não venham me dizer que não é assim, ora, por favor, leiam os jornais!) não entendo porque tanto horror na imprensa internacional diante da "ofensiva" do governo do Sri-Lanka contra os tamil.


Tem razão Nelson Rodrigues: cínica é mulher que trai o marido.

quinta-feira, setembro 11

Desejos pequenos

Tudo o que eu queria hoje era ter R$100,00 para não comprar um sapato novo porque eu não quero um sapato novo.

quarta-feira, setembro 10

O fim do mundo

Óia isso e me diga:
Bem que eu devia ter dado para aquele gostosão, não é? E agora não tenho nem o telefone dele, diacho...

terça-feira, agosto 26

Tem certeza?

Uai, mas o Dorival Caymmi já não tinha morrido?
Ah, foi o Jorge Amado, foi?
E já faz dez dias?
Ah, sei o Caymmi. Mas e o Jorge?

Baiano quando morre é assim. A gente só acredita quando já está comido pelos bichos.

quinta-feira, agosto 14

Resposta pra tudo

- Obrigada, não estou interessada na assinatura. Eu não leio jornal em papel para minimizar o desmatamento.
- Mas para cada árvore que derrubamos nós plantamos três! Lendo o nosso jornal a senhora estará contribuindo para a recuperação da Mata Atlântica.

quarta-feira, agosto 13

Viva as petecas medalhistas!

Algumas chinesas da ginástica olímpica são tão pequenininhas que suas reluzentes medalhas de ouro ficaram penduradas um palmo abaixo do umbigo.
Ou isso é muito obsceno ou é apenas o tipo de mente que eu tenho...

quinta-feira, agosto 7

Drummonda

Sem imaginação?
Talvez.
Mas Carlos Drummond de Andrade, que não ama mais ninguém já que ele não existe mais, há de concordar que o mesmo ceticismo poético, se é que essa expressão existe em algum lugar, ainda está presente.
De minha parte, acho uma graça :D

Tem espinho na roseira; cuidado vai cortar a mão
Pedro Alcântara do Nascimento amava Rosa Albuquerque Damião
Pedro Alcantara amava Rosa, mas a Rosa não amava ele não
Rosa Albuquerque amava Jorge, amava Jorge Bendito de Jesus
E o Benedito, bendito Jorge amava Lina que é casada com João
E o João, João sem dente, amava Carla, Carla da cintura fina
E a Carla, linda menina, amava Antônio violeiro do sertão
E o sertão vai virar mar e o mar virar sertão

E o Antônio, cabra da peste, amava Júlia que era filha de Odete
E a Odete amava Pedro, que amava a Rosa que era cria de Drummond
E o Drummond era casado com Maria que era filha de Sofia, mãe de Onofre e de José
E o José era casado com Nazira que era filha de Jandira e comcubina de Mané
E o Mané tinha 17 filhos, 10 homens e 6 meninas e um que ia resolve
E o rapaz tava já na adolescência, tinha brinco na orelha e salto alto pra crescer
E o Rodolfo que já era desquitado era um homem mal amado e não queria mais viver
E encontrou Maria Paula de Arruda que lhe deu muita ajuda, fez seu coração nascer
E são essas histórias de amor que acontecem todo dia, sim senhor

Karnak
(infelizmente não achei o cd no caos da minha estante para conferir os compositores e os dois primeiros links do google tb não ajudaram muito)

domingo, agosto 3

Medo mãe...

E não só porque ele é negro mas também por isso (e muitos outros issos na verdade...) é que ainda duvido (mesmo em tempos de estréia de Arquivo X: eu quero acreditar).

E antes que alguém me chame de petista de carteirinha (que eu não consideraria exatamente ofensivo, mas uma inverdade) informo-vos que organização sindical nos EUA não tem nada a ver com o modelo que temos no Brasil. Os sindicatos por lá não são organizados por categorias e sim por empresas.

Agora imagine um EUA com o Sindtramart. Geraria quase o mesmo pânico conseguido por George Wells na década de 30 não é não?

Como dizia minha Pripa: piedni...

sexta-feira, agosto 1

Palavrão Power

2008/8/1

de: Glaucia Marcondes

para: Luciana Priosta; Rita Passos


Minhas queridas, Lú e Rita


Não sei porquê, mas depois de ler o texto abaixo, me deu uma vontade louca de mandá-lopra vocês. Achei que era meu dever! É um texto inspirador e verdadeiro. Um ótimo final de semana procêis!

Bjinhos,

Gal



Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para prover nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o povo fazendo sua língua. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia. "Pra caralho", por exemplo.

Qual expressão traduz melhor a idéia de muita quantidade do que "Pra caralho"? "Pra caralho" tende ao infinito, é quase uma expressão matemática. A Via-Láctea tem estrelas pra caralho, o Sol é quente pra caralho, o universo é antigo pra caralho, eu gosto de cerveja pra caralho, entende? No gênero do "Pra caralho", mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso "Nem fodendo!". O "Não, não e não!" e tampouco o nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade "Não, absolutamente não!" o substituem. O "Nem fodendo" é irretorquível, e liquida o assunto. Te libera, com a consciência tranqüila, para outras atividades de maior interesse em sua vida. Aquele filho pentelho de 17 anos te atormenta pedindo o carro pra ir surfar no litoral? Não perca tempo nem paciência. Solte logo um definitivo "Marquinhos, presta atenção, filho querido, NEM FODENDO!". O impertinente se manca na hora e vai pro Shopping se encontrar com a turma numa boa e você fecha os olhos e volta a curtir o CD do Lupicínio.

Por sua vez, o "porra nenhuma!" atendeu tão plenamente as situações onde nosso ego exigia não só a definição de uma negação, mas também o justo escárnio contra descarados blefes, que hoje é totalmente impossível imaginar que possamos viver sem ele em nosso cotidiano profissional. Como comentar a bravata daquele chefe idiota senão com um "é PhD porra nenhuma!", ou "ele redigiu aquele relatório sozinho porra nenhuma!". O "porra nenhuma", como vocês podem ver, nos provê sensações de incrível bem estar interior. É como se estivéssemos fazendo a tardia e justa denúncia pública de um canalha. São dessa mesma gênese os clássicos "aspone", "chepone", "repone" e, mais recentemente, o "prepone" - presidente de porra nenhuma.

Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um "Puta-que-pariu!", ou seu correlato "Puta-que-o-pariu!", falados assim, cadenciadamente, sílaba por sílaba... Diante de uma notícia irritante qualquer um "puta-que-o-pariu!" dito assim te coloca outra vez em seu eixo. Seus neurônios têm o devido tempo e clima para se reorganizar e sacar a atitude que lhe permitirá dar um merecido troco ou o safar de maiores dores de cabeça

E seria tremendamente injusto não registrar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: "Fodeu!". E sua derivação mais avassaladora ainda: "Fodeu de vez!". Você conhece definição mais exata, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação? Expressão, inclusive, que uma vez proferida insere seu autor em todo um providencial contexto interior de alerta e auto-defesa. Algo assim como quando você está dirigindo bêbado, sem documentos do carro e sem carteira de habilitação e ouve uma sirene de polícia atrás de você mandando você parar: O que você fala? "Fodeu de vez!".

Sem contar que o nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de "foda-se!" que ela fala. Existe algo mais libertário do que o conceito do "foda-se!"? O "foda-se!" aumenta minha auto-estima, me torna uma pessoa melhor. Reorganiza as coisas. Me liberta. "Não quer sair comigo? Então foda-se!". "Vai querer decidir essa merda sozinho(a) mesmo? Então foda-se!". O direito ao "foda-se!" deveria estar assegurado na Constituição Federal. Liberdade, igualdade, fraternidade e foda-se.


2008/8/1

de: Luciana Priosta

para: Glaucia Marcondes; Rita Passos


Ok.


Minha mãe, que ultimamente anda dizendo que to falando palavrão demais, diria que é uma vergonha alguém ler isso e se lembrar de mim. Mas tudo bem. Porque em seguida ela lascaria o seu já famoso "Vai tomar no cu com força", expressão que estou pensando seriamente em patentear para ganhar alguma grana.


Só senti falta mesmo do "puta merda". Eu particularmente prefiro ele ao "puta que pariu" já que dito a maneira paulistana, com o "e" beeem aberto, proporciona além do benefícios já citados, uma abertura dos maxilares compatível com todo o desagrado que queremos expressar (aliás, ao meu ver, o mesmo benefício de "caralho" que nos obriga a abrir a boca bem grande, sem trocadilhos por favor, para que todo nosso descontentamento possa ser posto pra fora no menor tempo possível).


Eu poderia aqui ainda aprofundar-me na análise de outras expressões tais como "cagou-se", "embostiou" e outros derivados. mal cheirosos que tanto me agradam. Mas agora me dêem licença que vou lavar minha boca com sabão.



Luciana